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terça-feira, 2 de junho de 2015

Crônicas de um recruta - parte 19

Olá, amigos!

     Com algum atraso publico esta parte. Novamente a agenda está espremendo ao mínimo o meu tempo livre. Mas, sigo com o ritmo, ainda que tropeçando, caindo, levantando e seguindo...

     Os acontecimentos que estão sendo descritos pelo Flávio já estão nos dando uma pequena noção do que é realmente a vida na caserna. Vamos continuar, então a acompanhar a sua narrativa?


19

     Enquanto me coloco junto aos outros, observo seus rostos. O russinho está que não se aguenta. Sua gandola está empapada, como a minha. O Sandro me olha de relance, numa comunicação muda que me informa estar sentindo um misto de raiva, cansaço e desconforto. O Jackson "armário" está suado, mas não está com cara de morto como o resto de nós. Também, pra quem trabalhava lombeando sacos de cimento e "batendo massa" o dia todo, aquilo era brincadeira!
Em seguida, o sargentão recomeça o palavrório:
    - Ótimo, recrutas. Depois deste exercício estimulante, os senhores irão receber mais uma parte da sua instrução sobre a hierarquia e traquejo militar. Retomem formação dupla e sigam-me! Em formação! Marchar!
     Lá fomos nós outra vez para o auditório do pavilhão. Continuamos a receber a instrução designada pela manhã. Nem preciso dizer que esta sessão foi tão tediosa quanto a de cedo, se não mais. Só que desta vez ninguém no grupo se atreveu a dormir. A turma já estava ficando "escolada". O tempo escoa lentamente, e tenho de me esforçar muito para que a mente não vagueie. Tenho a tendência de não lhe por freios, assim ela voa livremente para onde bem entende. O problema é que com o passar do tempo a danada, desacostumada com regras, se torna indisciplinada e irriquieta, protestando pronta e veementemente contra toda e qualquer tentativa que eu possa fazer de lhe impor qualquer tipo de restrição, assim como um cachorro acostumado a correr livre se ressente - ou até mesmo morde - quando é atado a uma coleira e sua correspondente guia. Mas a pior parte não é colocar-lhe as rédeas, passa a ser mantê-las. E aí se reinstala o eterno duelo entre o Tom e o Jerry; "sonhar não custa nada!"... "é, mas para que algum dia um destes seus sonhos possa ter a mais remota chance de se tornar realidade é necessário se concentrar nela!"... "Sim, mas alguns deles, por mais que me esforce nunca se tornarão algo concreto"... "Então se concentre naqueles que são realizáveis e esqueça-os enquanto luta, fincando bem os pés no chão"... "Mas acontece que todos são irrealizáveis"... "Isso é papo de perdedor, comece pelo primeiro degrau da escada e realize-os, um por vez. Assim você pode chegar aonde quer..."
     Por vezes este confronto já é o suficiente para me tirar a atenção do que quer que seja. A minha sorte é que tenho duas habilidades salvadoras; capacidade de raciocínio rápido e dedução lógica apurados. Que, diga-se de passagem, já me tiraram de enrascadas várias vezes, como agora. Vendo minha cara de paisagem, o "jagunço" me pergunta, à queima roupa:
     - Vinte e seis, qual é o posto imediatamente superior ao de major?
Dou um pulo da cadeira, porque o desgraçado fez questão de me berrar bem no pé da orelha. Senti até algumas gotas da sua saliva batendo contra o meu pescoço:
    - Ahn...ééé... - balbucio, tentando reorganizar os meus pensamentos, e em seguida, num estalo - Tenente-coronel, senhor!
     O sargento nada diz, apenas grunhe insatisfeito. Ele queria que eu errasse, por motivos óbvios. Mas nesse caso específico, posso dizer que a "sorte ajuda quem a ajudou antes"... Acontece que sempre fui fascinado por história, em especial pela da Segunda Guerra Mundial. Li muitos livros a respeito, que em geral tratavam dos militares dos mais diversos países. E em todos observei os postos e a hierarquia entre eles. Foi só por isso que consegui responder a esta pergunta. Não quero nem pensar no "cozido" que ele tinha já pronto para me dar...
     A partir dali fiquei esperto. Minha mente viu que quase deu "caca" e decidiu por fim ficar quieta por sua própria conta, sem nem precisar mais da minha intervenção. Foi a melhor coisa que fiz, ou melhor, "fizemos", porque a cada pouco o Barreto voltava à carga, sempre com perguntas mais elaboradas, inclusive com "cascas de banana", fazendo todo o possível para que eu escorregasse em uma delas. Naquele momento, abençoei mil vezes meu bom hábito de leitura porque foi o que me salvou. Afinal, raciocínio rápido não vale nada sem ter com que raciocinar. Um porsche sem combustível não sai do lugar, meu velho!
     Entre uma questão e outra, giro discretamente a cabeça ao redor, à procura dos meus amigos. E os olhares que vejo são de admiração. O Vinícius me olha com satisfação, por perceber que tem um amigo "duro na queda", conforme me disse mais tarde. Depois de umas duas horas de "entrevero" o sargento entrega os pontos, pelo menos naquele momento. E assim chegamos às 17:00, que o instrutor anuncia com a seguinte frase:
     - Recrutas, são 1700 horas! Irei conduzi-los até o "almox" novamente, onde os senhores pegarão o restante do "enxoval" que lhes cabe. Na sequência, recolherão em seus armários provisórios a sua tralha e serão dirigidos até seus alojamentos definitivos, onde irão alocá-las em seus respectivos "depósitos". A cada um será designada uma cama, de acordo com o seu número de matrícula,...

"Peraí! Alojamento? Cama?"

     - ...já que estão informados que todos, sem exceção a partir de hoje se encontram em regime de internato durante as próximas quatro semanas. Entendido?

" Essa não!"

Continua!

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