Olá pessoal!
Mais uma parte das aventuras do nosso "reco" preferido dentro e fora dos muros da caserna. Pois é, a vida dele está se complicando um bocado por conta das circunstâncias e consequentes decisões que ele está sendo obrigado a tomar...
Como será que a coisa toda vai ficar? Vejamos...
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Apesar
da tremenda indisposição a caixola está a mil fazendo – ou pelo
menos tentando fazer – um plano. Até pedir guarida para meu tio
passou-me pela cabeça. Imediatamente
rejeito a ideia,
porque com certeza ele
avisaria os velhos na primeira oportunidade. E viriam com
fúria, na
certa.
Aí a coisa toda poderia feder porque
não estaria embaixo do seu teto e portanto não teria obrigação
nenhuma de respeitá-los.
É sério. Não toleraria outra surra dessas
de jeito nenhum.
Preciso
mesmo é sumir, afastar-me por um tempo. Nesse caso, das duas uma; ou
vou para uma pensão qualquer e alugo um quarto ou acho alguém pra
rachar o aluguel em algo que valha a grana gasta para se morar nele.
Como a segunda opção é inviável no curto prazo, fico
temporariamente
com a que restou.
Próximo
passo; Onde?
Pois é. O ideal seria perto do “20”. O
problema é que até
aonde
sei não há nenhuma nas redondezas e nem mesmo no bairro. Vou
ter que reservar tempo para procurar, e
isso terá de ficar para
outra ocasião.
Interrompo
o pensamento a cada nova onda de um
misto de náusea
e
dores.
Aspiro
sofregamente o balsâmico
ar gélido da manhã. Então
ouço sons vindo de outra parte do terminal; é
a lanchonete que está abrindo. Deduzo que já
devem
ser umas 07:00.
Por
impulso resolvo sair daquela inércia, indo para lá. Sento-me
num banquinho pegado ao balcão e coloco as mochilas entre os pés. A
funcionária prontamente vem me atender:
- Bom dia senhor. O que
deseja?
Penso por um instante e
respondo:
- Tem água de coco?
- Temos sim. O que mais?
- Por um acaso tem
aspirina ou algum outro remédio para dor de cabeça?
Ela
pensa por um instante, olhando-me fixamente
com
um misto de curiosidade
e comiseração:
- Olha, moço, não tem.
Mas deixa eu olhar na minha bolsa. Acho que trouxe de casa.
Dizendo isso, vai para os
fundos da loja. Não demora a voltar, entregando-me a cartela e a
água de coco que pedi.
Tomo
dois comprimidos de uma só vez. De canto de olho, noto que a
atendente continua a me olhar aquele jeito, na falta de ter algo
melhor para fazer, creio. Devolvo-lhe os comprimidos restantes com o
melhor sorriso que pude fazer à guisa de agradecimento e peço outra
caixa de água de coco. Só que desta vez, peço a de um litro. Bem
gelada. Não importa
de se estão fazendo 8 graus agora. Preciso desesperadamente de um
isotônico para repor todo o líquido perdido e tirar este gosto de
cabo de guarda chuva da boca. Nesse
meio tempo, continuo a matutar quais serão meus próximos passos.
Então
olho no estande de jornais que já tinha sido posto para fora.
Eureka! Devem ter anúncios de quartos para locar! Levanto-me, pego
um exemplar da Tribuna
e
ponho-me a devorar os classificados à cata de
um prospectivo
novo “lar”. Depois
de muito revirar, acho uma
pensão
com preço “cabível”
dentro do meu exíguo orçamento. Pago
pelo
jornal
e o que
que consumi, indo
para
o orelhão mais próximo dar
as tratativas.
Tudo
acertado, lá vou eu para o centro de Curitiba no primeiro expresso
que apareceu. Desço
na praça Eufrásio Correia, indo para a avenida Visconde de
Guarapuava via Barão do Rio Branco. Então
vou sentido Alto da XV até a Travessa da Lapa. Identifico o lugar
pela placa; “Hotel Maia”.
“Hotel”.
Um eufemismo para um infecto prédio de esquina de
três pavimentos, que
provavelmente foi construído nos tempo do Brasil Império e cuja
última pintura foi vista em bom estado pelo próprio Dom Pedro II,
presumo. Ao
entrar, vejo que o
interior da estrutura seguia o padrão: Paredes trincadas e sujas,
piso de linóleo antiquado e gasto, tapetes idem. No balcão que
fazia as vezes de guichê de recepção, fui recebido por uma polaca
quarentona de
corpo mediano,
parcamente
vestida e mal
ajambrada. Apresento-me,
meio ressabiado:
- Bom dia. Acho que
conversei com a senhora mais cedo. Sou o Flávio Barbosa.
A mulher olha-me
lascivamente de cima a baixo e então diz, com excelentes modos:
-
Bom dia, rapaz! Pode
me chamar de
você.
Eu reconheceria
esta sua bonita voz em qualquer lugar. Imaginei
que o dono fosse charmoso, mas
o que vejo superou
as minhas melhores expectativas, devo dizer!
“Bonito?
Nesse estado? Essa coroa tá bêbada, louca, ou só viu ogro na
vida!”
Não
dou a menor pelota para o que diz. Estou seco para cair na cama e
dormir até que este mal estar horrível passe. Essa
é a imperiosa necessidade de agora. Todo o resto fica para depois.
Assino
os papéis e o termo de compromisso. Pago o
período e
ela
me dá
em seguida o recibo de
quitação adiantada. A
coroa não para de falar um minuto, especulando,
dando
deixas marotas, sugestionando.
Só
se interrompe quando olha para um relógio de parede pendurado
na parede oposta,
ligando em seguida para um dos quartos, dizendo:
- Tempo esgotado.
Achei
estranho, mas não liguei os pontos de imediato. O
acordo que faço é de aluguel de um quarto com banheiro privativo
por uma semana. Que pode ser renovado semanalmente. O problema é que
não se podia cozinhar nos quartos, e o estabelecimento não oferecia
nenhuma refeição. Teria
de me virar. “Bom” -
raciocino - “é apenas temporário”.
Nisso,
um casal vem descendo as escadas que conduzem aos pavimentos
superiores. Eu disse casal? Tava na cara que a mulher era prostituta.
Observo
perplexo
o sujeito pagar a conta do quarto e seguir caminho, só. A quenga
ficou por ali, talvez
achando que eu fosse um potencial cliente.
“P***
que o pariu! Onde vim amarrar meu bode?”
Só
então compreendi
que a “pensão” na verdade era um daqueles hoteizinhos ordinários
de
lata rotatividade
que serviam de base de apoio para a prostituição sempre florescente
no centro da cidade. Maldita estupidez. Olho repetidamente para a
rapariga, a dona do estabelecimento e para o recibo. A coroa entende
tudo numa fração de segundo e
adianta-se:
- Não se preocupe,
querido. Tudo aqui só acontece por consentimento! Ninguém vai te
incomodar, prometo! - diz, dando uma piscadela marota.
Estendendo-me a
chave,completa:
-
Suba as escadas, siga o corredor até o final, porta à direita,
quarto 18. Vai
gostar
da estadia meu bem, principalmente
se fizer as escolhas certas!
Tenho
cer-te-za!
A
desgraçada da
polaca
solta esta última frase com tanta carga de sugestão na voz que
chega
às raias do ridículo.
Vendo
o que se passava, a
mulher da vida
farejou
que estava em território alheio. Assim,
tratou
de
sair
novamente
para a caçada deixando-nos a sós.
Maquinalmente
olho para a chave em minhas mãos dizendo apenas:
- Obrigado.
- De nada, anjo!
Responde – toda sorrisos.
Maldita
ingenuidade. Eu devia
saber que o troço estava barato demais! Bom,
mais uma vez “vou
me abraçar com o diabo,
já
que estou no inferno.”
É
provisório,
vou aguentar firme até achar um lugar melhor.
Subo penosamente as escadas até onde
seria meu cafofo
temporário. Quando
abro a porta, uma mistura de odores estranhos se apresenta. Mofo,
desinfetante,
poeira, banheiro mal limpo e alguns
outros
indignos de menção. Pelo
menos a cama estava arrumada e com lençóis limpos. Tranco a porta,
coloco as mochilas num canto e deito-me. Nova onda de náusea
aparece, ainda que mais fraca. É a água de coco fazendo seu
efeito. O
colchão era mais confortável do que parecia e moído como estava,
adormeci
em
questão
de
minutos.
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